"Anexar e comprar países"

Artigo de opinião escrito pelo professor António Caselas, AE de Santa Catarina


Como se sabe, invadir um país ou usar a força militar para o anexar é um delito contra o Direito Internacional.

A invasão da Ucrânia pela Rússia é uma indiscutível transgressão. A hipotética posse de territórios estrangeiros autónomos ou soberanos também. A ideia de tomar pela força ou por qualquer estratagema ou chantagem a Gronelândia ou o Canal do Panamá deve ser condenada e impedida. E será aceitável comprá-lo? Será ética e politicamente justificável?

A resposta é negativa. Nos finais do século XVIII, o filósofo Kant escreveu um pequeno ensaio intitulado A Paz Perpétua, Um Projeto Filosófico onde refere que «Um Estado não é património. É uma sociedade de homens na qual ninguém a não ser eles próprios pode mandar e dispor.»

A soberania não pode ser posta em causa em nome de qualquer projeto expansionista. Transgredir esse princípio permitiria multiplicar e intensificar conflitos e guerras. Ser condescendente ou indiferente perante um tal projeto significaria colocar em causa a paz e a estabilidade mundial ou global. Seria um estímulo ao caos e à lei do mais forte.

A compra, a troca ou a doação de território também não cabe no conceito de relações internacionais justas entre países soberanos. Esta questão é simultaneamente jurídica, política e ética ou ético-política. Se assim é, deveria causar indignação a ideia de alguns de o fazer. A simples declaração pública da intenção de anexar ou comprar territórios ou países deveria ser repudiada sem hesitações. Não apenas pelos possíveis visados, mas por todos os Estados independentes e pelas organizações mundiais. Trata-se de uma realidade que foi considerada inaceitável no passado e que no presente deve ser inequivocamente designada de absurda.

A complacência perante essa ideia é perigosa e não pode prevalecer sob nenhum pretexto. Não seria apenas a paz a ser ameaçada por tais projetos expansionistas; a ideia de tornar os territórios e os países bens transacionáveis é perversa e até anedótica. Transformaria as relações internacionais numa caricatura, num negócio em que os ricos e poderosos subjugariam os mais fracos ou vulneráveis como bem entendessem. Se tal ideia ou projeto ‘comercial’ seria inadmissível se envolvesse pessoas, o mesmo se aplica aos Estados. Inspirados ou não por Kant estamos, por isso, racionalmente autorizados a repudiar esses projetos.